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segunda-feira, 30 de abril de 2012

PENSAR TAVIRA…… UMA REFLEXÃO (4.ª Parte)


Na nossa última crónica, por escassez de espaço e também lapso nosso, não referimos que no fim da década em causa (década sessenta), já na Primavera Marcelista, um conjunto de jovens políticos do anterior regime (Estado Novo - União Nacional), criaram uma ala liberal na Assembleia Nacional, a qual se tornaria relevante porque serão eles a fundar e constituir o centro direita do universo politico partidário do pós 25 de Abril.
Acresce ainda também não ter sido referido, embora seja muito relevante, o declínio do sector da indústria em Tavira, particularmente com o encerramento da Fábrica Balsense (conservas de peixe), acompanhando a crise na pesca do atum, com o fim do lançamento de três armações para a sua captura (Abóbora, Barril e Livramento), assim como o fim da laboração da Fábrica J.A.Pacheco (moagem), com a sua deslocalização, na altura para Faro.
Mas olhemos agora para a década de setenta onde se irão verificar acontecimentos e factos tão relevantes quanto determinantes para toda a comunidade Mundial, Nacional e local, como sejam o conflito no médio Oriente, com a guerra do Yon Kippur (1973), ainda no mesmo ano o 1.º choque petrolífero, o fim da guerra do Vietname, a queda do ditador Franco, a chegada da televisão a cores ao nosso país e, especialmente para todos nós, o dia 25 de Abril de 1974, que pôs fim a quarenta anos de ditadura e abriu as portas da liberdade ao povo português.
E Tavira? Tavira teve, nesta década, pela negativa, o maior impacto na sua economia, o qual acentuou o declínio da sua importância, avaliada no sentido da relevância económica que tinha a nível regional, relevância esta que era factor de atractividade, para a fixação de pessoas e empresas, e consequentemente para o seu desenvolvimento e bem estar da sua população.
Em 1972 a Companhia Pescarias do Algarve lançou pela ultima vez a sua armação ao largo de Tavira, tendo ao longo de toda a época capturado um único atum, foi assim encerrado de vez o ciclo da pesca do atum na nossa cidade, ficando o sector da pesca remetido para a pequena pesca, pois as embarcações de médio porte (traineiras e arrastões) não tinham condições para entrar quer na barra, quer no rio, sendo assim impedidas de frequentar os cais de atracação e desembarque na cidade, já que não existia uma infraestrutura adequada para o efeito, um porto de pesca (quarenta anos depois parece que ainda não existe, nem irá existir).
A Fábrica de Conservas Balsense, que entretanto tinha operado a traineira “Flor do Sul”, com as suas enviadas, já tinha encerrado as portas e as referidas embarcações foram desviadas para Vila Real de Santo António e posteriormente para Olhão, por falta de condições para a sua operação em Tavira.
Restava a Fábrica Tavirense (antiga J.J.Celorico Palma) que lutava com fortes problemas de acesso às necessárias matérias-primas.
Chegados ao dia 25 de Abril de 1974, tínhamos pois uma fábrica de conservas de peixe, que, como referido, tinha dificuldades de acesso às matérias primas, uma Adega Cooperativa de Vinho de Tavira e uma Adega Cooperativa de Olivicultores, com um lagar para a respectiva produção de azeite, uma Cooperativa de Agricultores em Santa Catarina, alguns negociantes de frutos secos (amêndoas, figos e alfarrobas), uma produção de sal em crise e já sem peso económico, por a sua higienização ser efectuada nas fábricas, não em Tavira mas em Olhão (SINEXPRAL e SOPURSAL), uma agricultura em acelerada mudança para a
já referida monocultura da laranja (que fez desaparecer o lindíssimo entorno de amendoeiras, o qual, na Primavera, revestia de branco, qual manto de neve, todos os arredores da cidade, de Santa Margarida ao Vale do Almargem e à mata de Santa Rita), um sector de serviços ainda não muito influenciado pelo turismo nascente, com uma única unidade hoteleira no Hotel da Quinta das Oliveiras e várias pensões na cidade (Pensão Arcada, Pensão do Zeca da Bica, Pensão Imperial e Pensão Avenida, entre outras), para além de um empreendimento turístico, já na altura construído, a poente de Santa Luzia, as Pedras d’El Rei, e por fim um comércio assente na presença dos militares do CISMI, a caminho de África, os quais garantiam uma economia que embora, maioritariamente paralela, ia sustentando a cidade.
A madrugada de Abril, apanhou-nos pois já neste processo de decadência económica, só mitigada pelo aparecimento, como referido, das primeiras unidades de prestação de serviços na área turística.
Com Abril chegou a liberdade, mas infelizmente não chegou nem a responsabilidade, nem a competência, nem a capacidade para avaliar e relançar a nossa cidade para os desafios desta nova realidade, o ensino privado tinha sido extinto, o ensino técnico foi de imediato condenado, e a Escola de Pesca desapareceu também de imediato por pertencer à organização “fascista” do Almirante Tenreiro. Chegava o ditoso Estado Social.
O Estado passava a ser o sustento de toda uma população, mesmo que a mesma não estivesse muito interessada em produzir, ou em contribuir para esse mesmo Estado. O Estado que dava direitos sem impor deveres.
Esta realidade abarcava quer o sector patronal, quer o sector laboral, sendo que aquele, o patronato (assente na oligarquia das famílias que dominavam a economia Nacional no Estado Novo), fez muito rapidamente sair do território Nacional o máximo de recursos financeiros que na altura conseguiu reunir, deixando a nossa economia em grandes dificuldades.


Saídos da Ditadura do Estado Novo, ficámos à beira de uma nova ditadura, a Ditadura do Proletariado, protagonizada agora pelo Partido Comunista que tudo fez para colocar o nosso país na esfera de influência política da União das Republicas Socialistas Soviéticas (URSS), como mais um dos seus vários países satélites. Valeram de novo os militares que no dia 25 de Novembro de 1975 inviabilizaram o projecto marxista leninista, de caris estalinista, que se encontrava em marcha, instalando um sistema de democracia parlamentar, o qual viria a perdurar até aos nossos dias.
Bem hajam esses militares e permitam-me uma saudação especial ao falecido Major Melo Antunes, redactor do Documento dos Nove (que na realidade eram vinte e sete), e ao agora General Ramalho Eanes, que no terreno conduziu as operações militares.
É durante este período “revolucionário”, suportado pela aliança "Povo - MFA", que se cometem os maiores desmandos e atentados à propriedade privada (ex: reforma agrária e os diversos tipos de ocupações selvagens), à liberdade de pensamento e à autoridade do Estado, na linha dos “revolucionários” modelos “democráticos” dos sistemas de partido único, partido esse sempre constituído por uma elite politica (vanguarda), que liderando as massas de trabalhadores (os quais não tinham, nem poderiam ter, capacidade por si sós para poderem tomar quaisquer decisões), as conduziam para o caminho daquilo que seria o seu bem estar social e plena felicidade terrena. Deu no que deu, e em fins da década de oitenta, início da década de noventa, as massas cansaram-se de alimentar o aparelho corrupto de partido único, com as suas elites "revolucionárias", e deram com tudo de “pantanas”.
Vamos a Tavira, já que esta muito resumida e subjectiva apreciação política (necessariamente incompleta, pouco pacifica e certamente com bastantes incorrecções) teve como único sentido localizar a necessidade que a citada elite política "revolucionária", do pós 25 de Abril, teve de no imediato conduzir os processos de descolonização, para que as respectivas populações indígenas oprimidas (o que em muitos casos infelizmente até era verdade) pudessem ser conduzidas à liberdade e felicidade, pelas respectivas elites locais (vanguardas à boa maneira soviética), devidamente e revolucionariamente doutrinadas.


Claro que as referidas elites políticas fizeram o que fizeram (deixando as suas populações na mais inconcebível e inaceitável das misérias, como até hoje ainda se encontram),com enriquecimentos incalculáveis, grandes revolucionários. Viva a revolução proletária internacional.
Citando o tão oportuno e clarividente Mia Couto, "a maior desgraça dos países pobres é que criam ricos, em vez de criar riqueza".
“Nem mais um soldado para África”, slogan revolucionário da altura, sobre o qual não vamos opinar, por não ser este o espaço próprio para o fazer, mas que foi determinante para a nossa terra porque encerrou o ciclo de formação no CISMI, desaparecendo de um dia para o outro milhares de militares, que todos os anos permaneciam na nossa terra, com todas as consequências que essa estadia tinha para a economia local.
Ainda não tínhamos batido no fundo, porque a nova classe política saída do 25 de Abril (já que a anterior classe politica “fascista”, foi totalmente decapitada pelo “processo revolucionário em curso”, isto independentemente das suas capacidades, competências ou valores, valores estes tão relevantes quanto o são, os valores do sentido de serviço público à comunidade, o civismo e a honestidade, etc.), a nova classe dirigente, dizíamos, quiçá com uma muito boa formação política, não demonstrou ter quaisquer condições para assumir o poder, mas pior que isso verificou-se sim que estava muito bem preparada para se servir do poder, como veio, e continua a acontecer, e que está infelizmente demonstrado até à exaustão.
Tavira, entre insultos, pinturas de paredes e a assunção do poder (revolucionário), por quem falava mais alto e melhor (entenda-se falar melhor como a capacidade de levar os outros a seguir as suas ideias, ou seja simplisticamente “manipular” as pessoas), acabou por sucessivamente ir perdendo e comprometendo as poucas e restantes estruturas produtivas que a nossa terra possuía.
Assim, os milicianos já tinham deixado de passar pela nossa terra; a única e restante Fábrica de Conservas Tavirense, encerrou portas porque um adventista revolucionário (oriundo de Olhão) conseguiu convencer as trabalhadoras que a fábrica era delas, e naturalmente os legítimos proprietários (absentistas) encerraram a fábrica e alienaram o edifício; a Cooperativa de Produtores de Vinho de Tavira, entrou num complexo processo de má gestão, de incompetência e incapacidade dos produtores de uvas, para defenderem os seu direitos e interesses, caminhando para o seu encerramento; a Adega Cooperativa de Olivicultores entrou num processo semelhante ao anterior, numa clara indicação da falta de receptividade e decrepitude do movimento cooperativo; a produção de sal já se encontrava em crise, com a maioria das salinas a serem arrendadas às já referidas fábricas de higienização em Olhão, com a agravante de as mesmas terem destruído a estrutura física da maioria de salinas tradicionais, património este que será já muito difícil vir a recuperar; a pesca ficou reduzida como referido à pequena pesca com embarcações de boca aberta, muitas delas com um único tripulante (embarcações de recreio), o que indicia bem o individualismo no sector, indicador interessante para aferir do nível cultural médio dos intervenientes, não podendo pois por este motivo entender a importância das organizações de produtores como factor determinante para o seu desenvolvimento e ainda a regularização dos mercados; a agricultura a sofrer da mesma doença e cada vez mais virada para a fruticultura da laranja, embora com ainda algumas, poucas, sobreviventes explorações de estufas, para o plantio e produção de primores, destinados ao mercado local.  
Aí estamos nós na década de oitenta com o regresso dos militares aos quartéis, com uma constituição a caminho do socialismo, uma situação económica que nos levou, na altura, aos braços do FMI, e a nossa terra sem ninguém que quisesse pensar no nosso futuro enquanto comunidade.
A nova classe politica, revolucionariamente esvaziada dos valores do “fascismo” (ironia do autor, pois que os valores que enformam qualquer sociedade, não são património de qualquer que seja o sistema politico, ideologia ou partido, são isso sim património dessa própria sociedade), a referida classe politica alinhou-se nas diferentes estruturas dos partidos políticos, que para o efeito foram sendo criados, passando o tempo e gastando os recursos, que lhe são postos à disposição, em proveito próprio e em estéreis quezílias politicas, sem cuidarem do bem público que deveriam promover, e fazendo da política um verdadeiro e lucrativo modo de vida, para toda a vida, uma carreira, bastante lucrativa diga-se.
Tavira não escapou a este fim de década, com um apagamento económico que não preocupou os nossos autarcas, os quais nem se deram ao trabalho de tentar projectá-la para além dos mandatos de quatro anos para os quais foram sendo eleitos. Onde chegámos?
Seguem-se os anos oitenta, década da nossa entrada na Europa desenvolvida, e que tantas e tão relevantes consequências trouxeram para a nossa terra, matérias essas que iremos tratar numa próxima crónica que esperamos possa ser suficientemente interessante para ser seguida e lida por todos vós.
                                                                                               
                                                           Luís Costa Silva 

 Nota: Juntam-se os endereços de dois vídeos do Youtube, para quem quiser e tiver tempo para recordar Abril:
  


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